sábado, setembro 16, 2017

Lei para todos?



      Jean Baudrillard, mestre de paradoxos, me ensinou num café de Paris, tomando um vinho branco às dez da manhã, que o principal trabalho de cronista intelectual é fazer comparações para explicitar contradições. No Brasil, a direita acha que isso, em certos casos, é pura manobra para defender Lula e o tão odiado PT. Outro dia, falei disso no Esfera Pública, na Rádio Guaíba, com o ministro do STF Marco Aurélio Mello. Ele concordou que há incoerências. Vejamos: absolvido em segunda instância o ex-tesoureiro petista João Vaccari Neto continuou preso. Condenado em segunda instância o tucano Eduardo Azeredo permanece solto. Como explicar essa discrepância tão visível?
Vaccari deverá ser condenado em segunda instância brevemente. Azeredo espera o julgamento dos seus embargos. Parece assim: petista absolvido aguarda confirmação de condenação na cadeia. Tucano condenado mantém a esperança de absolvição em liberdade. O entendimento atual, que deverá ser derrubado com voto de Gilmar Mendes por já não servir só para enjaular adversários, é de que se vai para a cadeia depois da segunda instância. Outro caso: Lula está condenado em primeira instância apesar de centenas de juristas afirmarem que não há provas. Aécio permanece senador apesar das gravações em que combina crimes e das malas de dinheiro confirmando a realização do combinado.
O STF afastou o peemedebista Eduardo Cunha da presidência da Câmara dos Deputados e mandou prender o senador petista Delcídio Amaral sob alegação de flagrante duvidoso. Quando chegou coincidentemente em Aécio Neves o STF convenceu-se de ter errado antes e resolveu acertar entendendo ser prerrogativa exclusiva do parlamento afastar um dos seus. Que conclusão tira um amigo como eu de Baudrillard, o amante dos paradoxos e das irônicas contradições, que não rezava por qualquer cartilha? Esta: a Lava Jato pode pegar todo mundo, até caciques do PMDB, mas quando chega no PSDB a coisa muda de figura. Pode até ser que os rapazes de Curitiba e de Brasília não sejam seletivos, embora haja fotos de carinhos com tucanos, mas o sistema no topo da pirâmide tem sido. Ainda não se viu grão tucano em gaiola. Algum leitor acha que não havia razões para prender Aécio?
Se dependesse de alguns, Rodrigo Janot, que se tornará ex-procurador-geral da República nesta semana, seria condenado e preso antes de um tucano. Pelo quê? Por ter dados ouvidos a Joesley Batista, que denunciou Temer e Aécio com provas, o que desmoraliza outros delatores e foge do manual em uso. Eu tenho convicção de que Vaccari e Azeredo merecem morar juntos nalguma prisão brasileira. Começo a pensar que será mais fácil encarcerar Lula. Aécio não nasceu para a vida dura das prisões. Além disso, não representa perigo. Ninguém quer votar nele para presidente nem de clube de futebol mineiro. Mala por mala, se Geddel está na Papuda, Aécio está tão papudo como sempre. Já boa parte do ministério de Temer tem uma predileção pelas páginas policiais dos jornais. Nada que abale o chefe deles. Todos inocentes. A segunda denúncia por formação de organização criminosa é detalhe.
O cara que vê petismo num texto como esse esse revela o seu âmago.
O seu problema não é a corrupção, mas a ideologia.JM

Nenhum comentário: