Interessante que os jornais usem o termo "aliado" para aqueles que dão seu apoio a políticos, líderes, candidatos, membros do Judiciário etc. Depois de tantos escândalos (fora os que ainda virão) não seria mais correto chamar de "comparsa" ? (André Luis Coutinho, de Campinas, SP, no Painel do Leitor da Folha).
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Num tempo e numa terra em que ninguém mais confia em ninguém, nem no Judiciário, de nada adianta mudar leis ou presidentes.
Michel Temer pode cair mesmo se as novas leis trabalhistas forem aprovadas nesta terça-feira no Senado, pois a questão central permanece: a falta de confiança generalizada, não só no governo, mas nas instituições.
A ironia da história é que a reforma trabalhista representa uma vitória do governo Temer, mas poderá apressar o ocaso porque ele já terá cumprido sua missão no Palácio do Planalto.
"O PSDB está desembarcando independentemente do meu controle e da minha vontade", anunciou na véspera da votação o senador Tasso Jereissati, presidente interino do PSDB, após quatro horas de reunião dos caciques tucanos, na noite de segunda-feira, em São Paulo.
Para não variar, o PSDB nada decidiu, mas Tasso adiantou que o partido só vai esperar agora a votação da admissibilidade da denúncia por corrupção passiva na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, que pode acontecer nesta quinta-feira.
Aprovada a reforma trabalhista, só restaria a previdenciária, mas esta já foi desfigurada e jogada para as calendas, sem que Temer mostre condições políticas para retomar a discussão no Congresso.
Era nelas que Temer jogava sua sobrevivência, depois de ser encurralado pelas delações da Lava Jato, mas agora o establishment já está achando que o atual presidente se tornou um estorvo, e se movimenta abertamente para buscar uma alternativa.
Com a rápida deterioração da governabilidade, a base aliada, os mercados e a mídia já estão se acertando com Rodrigo Maia, o presidente da Câmara e possível sucessor, para manter a atual equipe e o projeto econômico, que é o que interessa.
Em Brasília, no domingo, reuniões para discutir o "pós-Temer" se sucederam durante todo o dia, com a participação de parlamentares da base aliada, líderes partidários, ministros e do próprio Rodrigo Maia.
No final da manhã, depois de uma conversa nada agradável com Temer no Palácio do Jaburu, que durou menos de uma hora, Maia seguiu direto para um almoço oferecido pelo vice-presidente de Relações Institucionais do Grupo Globo, Paulo Tonet, a um seleto grupo de deputados, como relatam Marina Dias e Daniela Lima, na Folha.
Ao longo de cinco horas de conversa, Maia deu como irreversível a queda do presidente Temer. Antes do dia acabar, o presidente da Câmara ligou para os aliados reunidos com Temer no Palácio da Alvorada e os convidou para um jantar com pizza e sopa.
"Em sua casa, Maia falou sobre a conversa com o presidente mais cedo, relatou seu almoço com a direção da emissora e vaticinou o fim do atual governo", segundo a Folha.
Enquanto isso, Temer tinha que se dedicar pessoalmente ao varejão do troca-troca de deputados aliados na CCJ, onde sofreria sua primeira derrota na segunda-feira, com o parecer favorável à denúncia apresentado pelo relator Sérgio Zveiter, do seu próprio partido, um sinal claro do desmanche da base aliada.
Por outra ironia da história, a ciranda da traição dançada em Brasília faz lembrar os últimos dias do governo de Dilma Rousseff antes da aprovação do impeachment.
A grande diferença é que Temer ainda parece contar com a maioria do Centrão, o baixo clero que domina a Câmara, onde a oposição ao presidente precisa de 342 votos para aprovar a denúncia.
Ao contrário de Dilma, seu ex-vice gosta e sabe negociar com deputados.RK