Há um grande filme em cartaz: “Os invisíveis”, dirigido pelo alemão Clau Räfle. Fui vê-lo no último sábado. Conta a história de quatro judeus que viveram escondidos para escapar à perseguição nazista. É uma história humana sensível e altamente dolorosa. Eles só conseguiram sobreviver graças à ajuda de alemães que se rebelaram no cotidiano, na medida das suas parcas forças, contra o horror hitlerista. O que o nazismo mais odiava e combatia? A diferença, a diversidade. Ideologia de extrema-direita, assentada no racismo e no darwinismo social, não tolerava a liberdade de pensamento.
As principais características do nazismo foram o antissemitismo, o eugenismo, o culto e o mito da superioridade racial do homem branco, o antimarxismo, a adoração fanática ao grande líder, o aparelhamento total da estrutura pública, da justiça ao sistema escolar, para propagação da ideologia do sistema, o Estado forte, a rejeição ao conceito de luta de classes e a defesa da propriedade privada. Os ideólogos nazistas defendiam uma sociedade dividida em classes sociais, recusavam o igualitarismo marxista e acreditavam na meritocracia como mecanismo de estratificação social e de legitimação da propriedade privada. O nazismo era nacionalista, antipacifista e antidemocrático. Foi a grande chaga do século XX.
Edgar Morin, que participou da resistência armada ao nazismo, publicou, já em 1946, um belo livro sobre o que viu: “O ano zero da Alemanha”. Vale citá-lo longamente: “Não há dúvida de que havia gradações dentro do nazismo. Existiram nazistas ativos, nazistas formais e nazistas constrangidos (como foi o caso de inúmeros estudantes)”. Mais: “Havia os que já eram nazistas antes de 1933 e os que se tornaram nazistas após 1937. Os americanos consideram os velhos e duros nazistas anteriores a 1937 como os mais perigosos. Muitos alemães tendem a considerar que os que se tornaram nazistas depois de 1937 são mais culpáveis, pois não tinham escusas para se deixar lograr pelas belas promessas e aderiram ao nazismo com conhecimento de causa, mesmo depois das leis de Nuremberg e das primeiras manifestações da política belicista de Hitler”. Não foi acaso.
“Os invisíveis” é um desses filmes que deixam um gosto amargo na boca. Por outro lado, revela a maravilhosa coragem daqueles que ousam se expor em defesa da dignidade humana enfrentando ondas e correntes. Como não se emocionar com a história da moça que se esconde no cinema até ser “adotada” pela senhora da bilheteria? Como não se entusiasmar com o genial falsificador de documentos que salvam vidas, mas se descuida e deixa queimar a papelada que lhe garante a sobrevivência? Como não se preocupar com a falsa viúva trabalhando na casa de um oficial nazista? Como não se encantar com as paixões do adolescente obrigado a viver na clandestinidade?
O sistema pretendia ser absoluto, tentacular, visível em todas as instâncias. A astúcia e a solidariedade souberam resistir a ele em alguns momentos e casos. Como mostrou Hannah Arendt, porém, o terrível é “banalidade do mal”, que não se apresenta como monstro. Lindo triste filme.JM.
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