quarta-feira, janeiro 03, 2018

Lugares...


Tempo de caminhar

      Entre as poucas certezas que trago na vida está a de que o tempo muda com o tempo. Não chega a ser uma certeza esclarecedora nem genial. É apenas uma percepção redundante e risível que se enraíza com a passagem dos anos no imaginário dos que estão passando e olham para trás tentando capturar um perfume que se perde. Aprendi com o melancólico poeta Eliot, que havia aprendido em textos sagrados, que há um tempo para cada tempo. Julgo humildemente que há um tempo para caminhar. E que esse tempo precede aquele em que só poderemos lembrar das caminhadas. O tempo de caminhar já não mais é o de querer chegar.
O tempo de querer chegar é o da idade da razão. Tempo de objetivos, metas e ambições dependentes do ponto final. É quando se quer ir rápido, engolindo caminhos e colhendo resultados. O tempo de caminhar, no sentido que estou tentando esboçar aqui, é o da fruição existencial e estética, lenta, suave, reflexiva. Quanto mais devagar, melhor. Há que se sentir os cheiros da natureza, colher o pó da estrada, armazenar na alma o canto dos pássaros, guardar num canto da mente a imagem de um morro, o voo repentino de uma ave, uma luz irisando uma lâmina de água, uma risada de criança correndo na frente, o rastro imaginário ou deliciosamente assustador de uma cobra, uma lembrança repentinamente exumada do passado como se estivesse viva.JM

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