terça-feira, novembro 14, 2017

O imaginário de Waack


O caso Waack

      William Waack é um jornalista famoso. Até semana passada ele apresentava solenemente o Jornal da Globo. Conservador, arrogante, grosseiro com os colegas, superficial, mesmo se é glorificado como detentor de grandes conhecimentos, não gozava de estima interna. Mas brilhava nos céus da mídia. Depois que vazou o vídeo em que condenava um comportamento como “coisa de preto” ele caiu do firmamento. Não lhe tem faltado, contudo, apoio de colegas tão ou mais conservadores do que ele. Todos o defendem relativizando sua fala: apenas um comentário infeliz, uma piada de mau gosto, quem já não errou que atire a primeira pedra, inveja, linchamento por redes sociais odiosas e sedentas de sangue, patrulhamento em tempos de politicamente correto.
A Rede Globo não pensou assim e afastou imediatamente o apresentador da sua função. Sejamos francos: ninguém faz esse tipo de comentário se não acredita no que está dizendo. Não foi o vídeo que vazou. Foi o imaginário de William Waack. Irritado, sentindo-se ao abrigo de qualquer olhar ou ouvido indiscreto, ele deixou o escapar o que carrega no coração, na mente e na ideologia. Um dos defensores de Waack já relativizou em outro momento a existência de racismo no Brasil. Por que só conservadores o defendem? Por julgarem que ele está sendo vítima de esquerdistas rancorosos. Waack é celebridade. Uma celebridade sempre encontra bons advogados gratuitos. Se fosse um jornalista de chão de fábrica, não seria socorrido com tanto ânimo.
Alguns daqueles que o defendem deixam escapar nas entrelinhas: podia ter sido eu. E certamente sussurram para si mesmos: preciso tomar cuidado. O caso William Waack é exemplar: revela os sentimentos da Casa Grande com o ruído do que consideram ser a Senzala. Os tempos, porém, estão mudando e já não se pode abafar o horror como um mero deslize. O Brasil está vazando por todos os lados. Tornou-se muito difícil realizar o desejo de Romero Jucá: estancar a sangria. A nossa sangria é ampla, vai da guerra à homofobia e ao racismo passando pelo combate ao bullying. O que sangra? O que deveria ser estancado? O preconceito ou o combate a ele? Na opinião de certos críticos do politicamente correto, o problema está na reação ao abuso e não na sua causa. Não cola mais. A sensibilidade social mudou. O Brasil se move.
O impávido William Waack aplicou-se um murro na cara. A sua postura no vídeo é a de dono do mundo. Repete três vezes a sua estupidez. Reage com palavrões ao menor incômodo. Não satisfeito, fornece sua explicação racista para o que o tira do sério. Resta aos seus amigos inconformados com a indignação nas redes sociais condenar os responsáveis pelo vazamento. Eles seriam frios, calculistas, maquiavélicos, vingativos, oportunistas e ressentidos. O ator Lázaro resumiu o rolo: “Racismo é crime e ponto final”. Quando o inconsciente fala, delatando seu porta-voz, é preciso tomar consciência do tempo no qual se vive. William Waack não é vítima da intolerância atual, mas o feitor que se perdeu no tempo e acordou vociferando como outrora. JM

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