Estudo realizado na UnB pelo agente civil Marcos Patrício Macedo faz parte de dissertação de mestrado. |
A Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) começou a investir em novas metodologias para identificar a origem e as rotas usadas por traficantes de drogas no Brasil. Pesquisa desenvolvida por um agente da corporação revelou que é possível identificar a origem dos entorpecentes com base na classificação das espécies de insetos encontradas nos produtos apreendidos. O estudo faz parte da dissertação de mestrado do biólogo e policial civil Marcos Patrício Macedo, 31 anos, desenvolvido na Universidade de Brasília (UnB) em parceria com a PCDF. Ele descobriu, por exemplo, que 7,5 quilos de maconha recolhidos no DF chegaram ao país provavelmente pelo Paraguai, além de passar por Mato Grosso do Sul e Mato Groso.Macedo explicou que a ideia inicial do projeto era estabelecer um novo procedimento padrão para subsidiar investigações de combate ao narcotráfico e revelar os caminhos que a droga percorre até chegar às cidades brasileiras. Segundo ele, o levantamento teve como base a entomologia forense, ciência que estuda insetos com aplicação em investigações criminais. “Para se trabalhar com o combate ao tráfico de drogas, descobrir as rotas de distribuição e a origem do produto é essencial para se conseguir bons resultados”, destacou.Durante a primeira fase de estudos, o biólogo recolheu manualmente 78 amostras de insetos encontrados em tijolos de maconha, apreendidos no DF em duas operações da polícia (veja arte). “Em algumas tijolos, encontrei 10 pedaços de asas e de patas e, em outras, não encontrei nada. Essa é a grande dificuldade do trabalho”, explicou.Em seguida, Macedo analisou em laboratório os fragmentos encontrados e identificou quatro tipos de insetos: uma formiga, dois percevejos e um besouro. Após a identificação, o agente conseguiu constatar a espécie de três deles. A formiga é da família Cephalotes pusillus. Os dois percevejos, da Pentatomídeos. Não foi possível identificar a espécie do besouro.“Para se ter uma lucratividade com a venda de maconha, é necessário o plantio em esquema de monocultura, em locais abertos e amplos. Dessa forma, os insetos acabam chegando até a droga. Quando a planta é cortada, triturada e embalada, o próprio animal vai embalado”, detalhou.
Cruzamento
Com os resultados em mãos, apenas as espécies classificadas foram utilizadas no passo seguinte do levantamento. Assim, foram mapeadas três regiões — interior de Pernambuco e Maranhão; sul da Colômbia, norte da Bolívia e Paraguai; sul do Mato Grosso e Mato Grosso do Sul — , com base em relatórios da Organização das Nações Unidas (ONU), que apontam os locais onde ocorreram as maiores apreensões de drogas na América do Sul.Identificados os três centros de distribuição conhecidos no Hemisfério Sul, Macedo cruzou os dados levantados para constatar o lugar em que todas as espécies poderiam ser encontradas juntas. Das três, uma não ocorria no Nordeste, e outra não ocorria na Colômbia e na Bolívia. “Assim, identificamos que a droga veio do Paraguai, do sul do Mato Grosso e do Mato Grosso do Sul. Mas existem algumas ressalvas. O fato de uma espécie não ser encontrada em uma determinada localidade não significa que ela não exista nesse espaço. Ainda precisamos avançar na pesquisa”, ponderou.
Amostra da droga analisada: procedimento pode virar padrão |
Estudo genético
Com a possível identificação da origem e das rotas usadas para a maconha chegar ao país, o biólogo Marcos Patrício Macedo pretende ampliar a pesquisa desenvolvida durante o mestrado e realizar um estudo dos genes dos insetos encontrados.Vamos confrontar a familiaridade genética das amostras encontradas nos tijolos de maconha com a população do campo. Dessa forma, poderemos identificar um padrão específico e fazer uma ligação mais estreita entre o fragmento do animal recolhido no Brasil e o bicho que vive nos espaços naturais”, explicou.Caso a segunda fase do levantamento seja positiva, a descoberta poderá alterar o planejamento de novas políticas públicas no combate ao tráfico de drogas. Segundo Macedo, em teoria, é possível que se faça uma pesquisa de identificação em até dois meses. “Nesse tempo, eu possivelmente conseguiria responder se a classificação dos insetos e a comparação deu certo. Mas isso também dependeria da qualidade das amostras e das condições de trabalho”, ressaltou. O pesquisador avaliou que, caso o estudo se transforme em um procedimento padrão que trate exatamente da investigação por insetos, não necessariamente será a única ferramenta para esse tipo de análise. “Se a pesquisa entomológica for confirmada por outros métodos, ela ganha corpo. Mas, mesmo assim, é como um remédio, exige diversos testes para se tornar metodologia padrão. Caso isso não ocorra, pode gerar um embate muito grande nos tribunais, pois a metodologia poderia ser contestada.”